Tarcisio Barreto Celestino, engenheiro civil especializado em túneis, é destaque da edição de outubro da revista inglesa Tunnels & Tunnelling International, referência nesse segmento. Ele foi entrevistado pelo jornalista Julian Champkin. Celestino foi presidente da ITA (Associação Internacional de Túneis e do Espaço Subterrâneo) e do Comitê Brasileiro de Túneis da ABMS. Ele hoje equilibra seu papel de professor na Escola de Engenharia de São Carlos, da USP, com a coordenação da área de geotecnia da Themag Engenharia. Na entrevista, ele é qualificado como “engenheiro de renome internacional”. Leia a seguir destaques da entrevista.
Início da carreira
“Embora eu tenha me formado na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo – uma das melhores, senão a melhor escola de engenharia do Brasil – nunca ouvi falar de túneis durante meu curso. A minha não era a única escola de engenharia que não ensinava sobre túneis. Muitas escolas de engenharia ao redor do mundo não o fazem. E esse é um problema que voltou mais tarde em minha carreira, porque abordá-lo se tornou uma missão para mim quando eu era presidente da ITA.”
Seu primeiro contato com túneis não veio até o segundo ou terceiro ano de sua carreira em engenharia. “Estava trabalhando no sistema de abastecimento de água para a cidade de São Paulo. Antes disso, só havia trabalhado no projeto de barragens, mas fui realmente atraído pelo trabalho em túneis. Tive um ótimo mentor em minha empresa naquela época, pelo qual sou grato; e pouco depois fui para Berkeley para o meu doutorado, onde tive uma educação formal com Tor Brekke. Um norueguês, ele foi professor na Universidade de Trondheim (NTNU) antes de Berkeley. Tenho muito orgulho de ter sido seu aluno.”
Trabalho acadêmico e profissional
“Além de minha carreira como engenheiro, também sou professor da Universidade de São Paulo. Não sou professor em tempo integral, mas tenho responsabilidades relacionadas ao ensino e à pesquisa.
“Fui muito afortunado por ter sido convidado para esta posição, pois é realmente uma combinação muito boa. O resto do tempo trabalho para a Themag Engenharia, que é uma grande empresa de consultoria no Brasil. Estou envolvido com projetos de trabalho não convencionais, então também há uma mistura de pesquisa no meu trabalho lá.
“Além do meu envolvimento com a Universidade de São Paulo, sou coorientador de um programa de doutorado na Universidade de Purdue, nos EUA. O orientador principal é o professor Antonio Bobet, com quem me encontrei há muito tempo; funciona muito bem.
“Essa mistura de trabalho acadêmico e comercial me convém – fazer trabalho prático para ver um projeto até o fim e ajudar outros a pesquisar. A posição acadêmica também cria algum tipo de visibilidade que o trabalho na empresa não necessariamente fornece.
Obras subterrâneas e sustentabilidade
A sustentabilidade é outro tema de interesse. A construção de túneis usa energia e tem alto custo de carbono e emissões, mas seu uso, quando considerado a longo prazo, diz ele, quase sempre recompensa esse custo muitas vezes – tanto na redução de emissões quanto em outras medidas de qualidade de vida.
“O metrô de São Paulo é um exemplo disso,” ele diz. A extensão da Linha 5 do Metrô da cidade foi recentemente concluída; a nova Linha 6 do Metrô, em construção e programada para ser inaugurada em 2025, é considerada o maior projeto de infraestrutura em andamento na América do Sul.
“A poluição causada por carros tem muitas consequências negativas em termos de custos e morbidade”, diz ele. “O Metrô de São Paulo reduziu enormemente o número de carros na cidade. Basta pensar nas economias monetárias e no número de pessoas que sofriam e até morriam devido à poluição.”
“O Banco Mundial estimou a economia de gases de efeito estufa ao longo da vida útil dos ativos da extensão e modernização da Linha 5 do Metrô em 2.960.000 toneladas de CO2 equivalente, quando as economias da mudança modal de automóveis e ônibus para o metrô são incluídas.
Túnel Santos-Guarujá
Tarcisio Celestino é um defensor da construção de um túnel para unir Santos ao Guarujá, no litoral paulista. “Um túnel entre Santos e Guarujá, diz ele, exigiria rampas mais curtas do que uma ponte entre as duas cidades. Tais rampas seriam parcialmente subterrâneas ou submersas, e a obra toda teria apenas 1,5km de comprimento, dos quais 800 metros seriam subaquáticos. (A distância rodoviária entre as duas cidades atualmente é de 45km). As propostas atuais são para um túnel imerso – o primeiro túnel desse tipo a ser construído no Brasil. Terá seis faixas de tráfego, a uma profundidade máxima de 21 metros. Nenhum terreno à beira-mar seria ocupado; e as emissões decorrentes do tráfego seriam claramente muito menores.
Um sonho
“Ele também observa que São Paulo, além de estar a 80km de distância de Santos, está localizada em um planalto a 760 metros de altitude; as mercadorias descarregadas no porto de Santos devem ser transportadas pelas íngremes e sinuosas escarpas da Serra do Mar para chegar a São Paulo. Aqui, também, sua imaginação sugere uma solução que reflete os objetivos de sustentabilidade: “Um túnel ferroviário reto, em um gradiente constante, com locomotivas elétricas poderia transportá-las com muito menos emissões.”